terça-feira, 11 de setembro de 2012

naufrágios

William Turner, The Shipwreck (1805), Tate Gallery, Londres

O horror das tempestades do mar, retratado pelos pintores românticos dos séc. XVIII e XIX, contrasta com a tranquilidade encontrada pelos irmãos Bullar ao chegarem à ilha das Flores em 1839. Na aldeia onde passaram a noite vivia-se entre os destroços do mar... Dentro e fora de portas. Tabuchi descreve assim a passagem dos ingleses pelas ilhas açorianas:

A meio da viagem pararam para passar a noite numa aldeiazinha de pescadores (...). De longe ela pareceu-lhes bonita e de ordenada geometria, como são frequentemente as pequenas aldeias de pescadores. As habitações, todavia, pareciam-lhes de forma bizarra. Quando entraram no lugar perceberam porquê. Quase todas as casas tinham como fachada a proa de um barco; eram casas de planta triangular, algumas de madeira preciosa, cuja única parede de pedra era a que fechava os dois lados do triângulo. Algumas eram casas belíssimas, contam os atónitos ingleses, cujo interior pouco tinha de casa porque os objectos - lucernas, bancos, mesas e até as camas - quase tudo tinha sido apanhado no mar. Muitas tinham vigias que faziam as vezes de janelas e visto que davam para o precipício e para o mar lá em baixo, parecia que se estava num barco ancorado no cimo de uma montanha. Aquelas casas eram construídas com restos de naufrágios que os rochedos das Flores e do Corvo ofereceram durante séculos às naus que por ali passavam.

in Mulher de Porto Pim, Antonio Tabuchi, 1983

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